Luiz Carlos Azenha (na foto, de pé) concedeu entrevista a blogueira gaúcha Maiara Marinho |
Luiz Carlos Azenha é jornalista formado na Universidade de São Paulo (USP) pela Escola de Comunicações e Artes (ECA). Trabalhou com jornalismo esportivo e foi correspondente internacional pela Rede Manchete. Além de ter trabalhado em grandes veículos de comunicação como a Folha de S. Paulo, SBT, Rede Globo e - atualmente - Rede Record. Em meados de 2003, criou o blog Viomundo. - inicialmente hospedado no site Globo.com - pois suas reportagens não iam ao ar completas. Para suprir essa falta de informação, Azenha criou o blog. Suas divergências com a Rede Globo iniciaram em 2006, quando não considerou correta a postura da emissora diante as eleições daquele ano. Para o jornalista, a emissora tinha Partido Político e, sendo assim, defendia os seus interesses através do jornalismo. Em 2008, rompeu o contrato com a Rede Globo e foi para Washington. Lá, estudou a internet com o intuito de ampliar o seu blog nacionalmente. Segundo Azenha, o Viomundo faz crítica de mídia, é um blog de esquerda - ideologia que o representa -, tem conteúdos diferentes dos jornais tradicionais. Pois - afirma o jornalista - "no Brasil os jornais são conservadores. A Folha, o Estadão são jornais de direita. Conservadores." E, acrescenta: "Existe um grande grupo no Brasil que não é representado pela mídia". Ganhador de dois prêmios Vladimir Herzog, Azenha defende a democratização da comunicação.
Jornalismo Independente: O jornalismo como é feito no Brasil teria espaço em uma sociedade com conhecimento capaz de criticar a política coerentemente?
Luiz Carlos Azenha: O jornalismo praticado no Brasil muitas vezes
visa à desmoralização da política. Foca nos corruptos mas não nos
corruptores. Motivo? Os corruptores são muitas vezes os grandes
patrocinadores do jornalismo. Bancos, empreiteiras, empresas de
transporte e assim por diante. Desmoralizar a política é uma forma de
garantir o papel central da mídia no próprio jogo político. Da às
corporações midiáticas, por exemplo, o poder de barganha necessário à
aprovação ou rejeição de leis que beneficiem seus interesses. Sim,
porque a informação deixou de ser o produto principal das corporações
midiáticas, que ganham dinheiro em várias atividades "paralelas". Ter o
poder de barganha permite à Globo, por exemplo, obter benefícios em
todas as áreas e esferas do poder: municipal, estadual, federal,
Legislativo, Executivo, Judiciário. A mídia é parte da construção
oligárquica, basta ver quem são os políticos/empresários afiliados às
grandes empresas de comunicação. É uma espécie de conluio, uma panelinha
de poucos. Nesse sentido, talvez apenas o México tenha uma concentração
de poder midiático maior que o Brasil.
JI: As empresas de TV aberta apresentam a mesma perspectiva para a sociedade?
JI: As empresas de TV aberta apresentam a mesma perspectiva para a sociedade?
LCA: As empresas de TV aberta se distinguem dos grandes
conglomerados impressos (Folha/UOL/associados,
Estadão/Eldorado/associados, Veja/MTV/associados) pela completa ênfase
no entretenimento ou no que o jornalista José Arbex Jr. chamou de
showrnalismo. Nenhuma delas cumpre a Constituição no que diz respeito
aos conteúdos regionais, por exemplo. Como os capítulos da Constituição
de 1988 relativos à comunicação nunca foram regulamentados, ficam à
vontade para exercer a propriedade cruzada (quando uma mesma empresa tem
emissora de TV, rádio e jornal no mesmo mercado, o que em muitos países
é proibido por concentrar poder em apenas um grupo econômico).
JI: A televisão tem influência capaz para educar um cidadão?
LCA: Considerando o número de horas que o brasileiro passa por
dia diante da TV, sim. Educar ou deseducar. Pior que isso, a TV muitas
vezes promove ou reforça preconceitos, concorre para sexualizar
precocemente as crianças, promove o consumismo, enfatiza os valores de
um mundo individualista e baseado no dinheirismo.
JI: A censura é uma defesa ideológica não assumida nas grandes empresas de jornalismo?
JI: A censura é uma defesa ideológica não assumida nas grandes empresas de jornalismo?
LCA: As corporações da mídia, no Brasil, pretendem "pairar" sobre
a sociedade, como se não fizessem parte dela, nem interferissem nas
escolhas dos brasileiros em todos os campos. Comportam-se como árbitros,
como se a troca de canal no controle remoto fosse equivalente a uma
escolha feita em plebiscito ou eleição. Esquecem-se que o público só
pode escolher dentro de uma campo limitado de ofertas. Por isso, milhões
de jovens pretendem exercer suas próprias escolhas na internet. Ficaram
livres da ditadura da grade de programação, que ironicamente é mesmo
uma "grade" que faz prisioneiros. Estes mesmos jovens sabem que as
corporações de mídia são empresas com seus próprios interesses e fazem
escolhas de acordo com seus interesses. Mentem, distorcem e omitem e se
dizem "neutras".
JI: A Rede Record, o SBT, a Bandeirantes e a Rede Globo se diferenciam entre si em que aspecto especificamente?
JI: A Rede Record, o SBT, a Bandeirantes e a Rede Globo se diferenciam entre si em que aspecto especificamente?
LCA: A Globo foi gestada nos laboratórios da ditadura militar
como um veículo para promover a "integração nacional". A Globo
acompanhou a expansão da rede de microondas (antenas) da Embratel para
atingir todo o país. Foi beneficiada desde então por uma rede construída
com dinheiro público. Portanto, a Globo é um dos símbolos do que resta
da ditadura militar no Brasil e tem uma longa história de manipulações
políticas, na qual é imbatível em relação às concorrentes. A Globo
engole hoje quase 50% de todos os recursos publicitários do governo
federal.
JI: Com as manifestações a mídia independente tem a chance de se fixar capaz de ganhar confiança e espaço no país?
JI: Com as manifestações a mídia independente tem a chance de se fixar capaz de ganhar confiança e espaço no país?
LCA: Sim, por dois motivos: por mostrar muitas vezes ao vivo e
sem filtro os acontecimentos; por causa do cansaço dos jovens com o
formato do conteúdo dos meios tradicionais (formalismo dos repórteres,
por exemplo, quando a mídia livre é muito mais descontraída).
JI: O que você considera como depredação e vandalismo nas manifestações?
JI: O que você considera como depredação e vandalismo nas manifestações?
LCA: Os manifestantes argumentam que tudo está incluído na
política. Que as depredações e o vandalismo são formas de protestar, por
exemplo, contra o poder público ou o poder econômico que também cometem
crimes graves e amplos. Pessoalmente não acredito em manifestações
violentas ou destrutivas, mas acho necessário que os jornalistas olhem
também para os abusos do poder do estado, especialmente os cometidos
pela polícia. Esta violência às vezes explica (sem justificar) aquela.
JI: Você acredita que com a regulamentação dos meios de comunicação haverá pluralidade e democracia no jornalismo?
JI: Você acredita que com a regulamentação dos meios de comunicação haverá pluralidade e democracia no jornalismo?
LCA: A regulamentação é um dado da realidade em todos os países
desenvolvidos. Regulamenta-se a distribuição de gás, o transporte
público e a distribuição de energia elétrica. Todos são concessões
públicas. Portanto, por que não regulamentar as emissoras de rádio e TV,
que são concessões públicas? No Reino Unido o órgão regulador é o
Ofcom, que influi inclusive no conteúdo, além de ter poder para punir
quem fizer coberturas jornalísticas distorcidas. Notem que há uma
distinção clara: estamos falando das emissoras de rádio e TV.
Nada a ver com a imprensa escrita, os jornais e as revistas. Com a
regulamentação você pode exigir diversidade de conteúdo, diversidade
regional, coibir crimes jornalísticos (exemplo? Escola Base) e combater a
propriedade cruzada, aquela que permite à família Sarney, por exemplo,
ter a principal emissora de TV, de rádio e o principal jornal de São
Luís do Maranhão, através dos quais controla a política local.
JI: Quais as consequências sociais da distorção dos fatos e do jornalismo tendencioso?
LCA: As consequências são para a própria democracia, na medida em
que meia dúzia de famílias exercem sem moderação um poder para a qual
não foram eleitas. Escolhem pautas políticas, candidatos, assuntos que
devem ou não ser divulgados, influenciam em eleições e fazem pressão
sobre todos os poderes constituídos, em todas as esferas. Distorcem a
economia ao fazer campanhas pelo aumento da taxa de juros ou contra os
sindicatos. Atacam programas sociais e pregam a privataria. O que
reservam aos que discordam? Assassinatos de caráter, através dos quais
destroem reputações de juízes, delegados, senadores, deputados,
prefeitos e assim sucessivamente. Jornalismo investigativo de encomenda,
com reportagens para atacar adversários. Tudo isso distorce a
democracia, na medida em que meia dúzia de empresários falam com grande
força, enquanto milhões não tem voz (nem mesmo em rádios comunitárias,
pequenos jornais ou blogs), seja por falta de verbas publicitárias
(concentradas com os grandes), seja por falta de acesso (os grandes
meios se concentram no eixo Rio-São Paulo), seja por perseguição (a
Polícia Federal e a Anatel, provocadas por grandes emissores, atacam as
pequenas sob a alegação de que são piratas).
JI: Como modificar a estrutura “senso comum” na sociedade com o jornalismo?
JI: Como modificar a estrutura “senso comum” na sociedade com o jornalismo?
LCA: Educação.
Toda ação política é altamente educativa. Por exemplo, com o Projeto de
Iniciativa Popular do Forum Nacional pela Democratização da Mídia
pretendemos fazer com que o Congresso aprecie uma lei para regulamentar a
mídia eletrônica, que se encontra neste endereço. Dependemos das
assinaturas de todos:
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