Os desafios da mídia alternativa, do jornalismo independente
e da produção livre de informações frente à vigilância e às imposições do poder
tradicional foi o tema de um dos mais concorridos e movimentados debate do Conexões Globais, ocorrido em Porto Alegre/RS, no último sábado (25/05/13). Em virtude desse debate, o Blog Barão Gaucho preparou duas grandes
entrevistas especiais. A primeira delas já apresentada ontem, com a jornalista
da Carta Capital Cynara Menezes. Hoje
é a vez de transcrevermos a entrevista coletiva de Franklin Martins concedida
aos órgãos de imprensa, incluindo o Barão, antes de participar da mesa.
Franklin Martins tem uma trajetória extensa e importante
como jornalista político. Líder estudantil ativo na resistência a ditadura
civil-militar que derrubou o governo João Goulart, Martins foi ministro da
Comunicação Social do Brasil durante o mandato presidencial de Luiz Inácio Lula
da Silva até dezembro de 2010. No governo, Franklin Martins trabalhou com as
relações do governo com a imprensa, com a publicidade oficial, com a construção
do projeto de uma rede nacional pública de TV e com o debate sobre a adoção de
um novo marco regulatório da mídia no Brasil. Após sair do governo, vem se
dedicando a escrever e debater sobre esses temas em todo o país.
Resumo da entrevista
Nesta entrevista de meia hora de duração, falou entusiasticamente
da comunicação na era da internet, apresentou argumentos consistentes em favor
de um novo marco regulatório da comunicação dizendo esperar que o governo
lidere esse debate na sociedade. Elogiou ainda o projeto de lei de iniciativa
popular que propõe um novo marco regulatório considerando-o maduro para
possibilitar um debate transparente e sereno. Afirmou que a mídia empresarial
vive uma crise de credibilidade pois se divorciou da busca pelos fatos, avaliou
que o Brasil vive um momento melhor do que o período da Ditadura inclusive em
relação a juventude. Disse que o centro
da questão da liberdade da mídia é garantir liberdade de fala a quem não tem
muito dinheiro, e não tolher a liberdade dos meios de comunicação empresariais.
E finalizou, analisando a nossa lentidão em relação a outros países da América
Latina que já estão mais avançados em criar marcos regulatórios da comunicação.
Concluiu que temos uma característica histórica de formar lentamente maiorias,
mas que nossas transformações costumam ser consistentes. Posicionou-se com
esperança em relação a mudanças importantes na área da comunicação.
O conteúdo da entrevista que repassamos ao leitor é
consistente, e fizemos questão de transcrevê-lo na íntegra, a despeito de sua
extensão, por julgar uma importante reflexão sobre um tema relevante da agenda
nacional. Com a palavra, Franklin Martins.
A comunicação na era
da internet
A internet abre a possibilidade de todo mundo falar. Isso
não quer dizer que vai falar a coisa certa. Vai falar a coisa certa, vai falar
a coisa errada, vai falar coisa séria, vai falar bobagem, vai ter de tudo. Mas
é o seguinte: Quem disse que os donos da fala antes só falavam coisas sérias,
só falavam coisas importantes e verdades? Eles também mentiam, falavam bobagem,
se expressavam mal, difundiam preconceitos, defendiam interesses, então, nesse
sentido, a bagunça da internet, blogosfera, tudo isso, é uma bagunça bem-vinda,
embora seguramente com o amadurecimento ela vai acabar produzindo coisas vamos
dizer assim mais estáveis, mas eu acho que pra juventude, olha é uma coisa
extraordinária ela poder falar, chegar longe e não ter que estar pedindo
licença a ninguém para entrar na discussão.
Democracia e
comunicação, velhas e novas mídias
Eu acho que nós estamos vivendo um processo de
democratização da mídia apesar da mídia. Mesmo com a mídia não querendo, por
causa da internet, porque como eu dizia não existe mais um único núcleo ou
poucos núcleos produtores de informação, isso começou a ser quebrado, então
hoje em dia você tem muito mais gente se expressando. Mas isso acontece na
internet, isso acontece nas novas mídias. Nas velhas mídias não acontece,
porque algumas das velhas mídias são muito caras, muito custosas, exigem recurso
muito grande e por isso mesmo a maioria das pessoas não tem como reunir esses
recursos pra isso, mas isso não é um problema para a velha mídia porque ela é muito
custosa, exige recursos muito grandes e já não tá dando o grande retorno que
dava antes, então tem muitas das velhas mídias dando problemas econômicos muito
sérios, é um modelo de negócio que está em crise. Então, nas velhas mídias você
tem isso e você tem concentração. Eu acho que é absolutamente indispensável
que no caso das comunicações eletrônicas, e eu não estou me referindo a jornal
de um modo geral, os jornais e revistas e impressos, a comunicação eletrônica
vale dizer telecomunicações e radiodifusão, ou seja, tevê e rádio tem que haver
mais pluralidade do que há hoje no Brasil. O Brasil não tem um marco regulatório
pra isso, não tem leis, nós vivemos um cipoal de gambiarras, o nosso código
geral de telecomunicações tem 51 anos de idade, ele é de uma época onde a televisão
era em preto e branco, não existia satélite, não existia rede nacional, não
existia videoteipe, não existia digitalização, existia mais televizinho do que
televisor no Brasil, eram uns dois milhões de
televisões no Brasil, e nós continuamos com a mesma coisa. Evidente que
isso não resolve o problema. E nós vivemos hoje um processo de convergência de mídias
que vai diluindo as diferenças entre o que é telecomunicações e o que é
radiodifusão. É muito difícil separar o que é um computador e o que é um
aparelho de televisão. Cada vez vai ser mais difícil. O que é um celular e o
que é uma televisão portátil. Você vai poder assistir televisão numa tevê
portátil, num celular, num computador, vai poder não, já se assiste e cada vez
vai se acentua. Ou seja, se não tiver regra, se não tiver uma nova pactuação é
evidente que quem vai vencer é o mais forte. Se depender do mercado vence o mais
forte, e no caso são as telecomunicações e um outro ator que está aparecendo
que são os googles da vida que começam a aparecer e começam a se tornar porta
da entrada para a internet, é um problema importante a ser discutido. Então,
nós temos a possibilidade de fazer uma pactuação hoje em dia, uma nova pactuação, um debate
público, aberto, transparente, onde todo mundo participe, seja ao final
decidido no Congresso. Mas tem que ser aberto, público e transparente, não é
numa sala fechada com os técnicos do governo decidindo e fazendo lobby. Não, uma discussão aberta na
sociedade do que nós queremos. Vamos aproveitar que tem essa passagem do
analógico para o digital e uma formidável ferramenta que é a internet para
oferecer mais (mais conteúdo, mais informação, mais entretenimento, mais jogo,
mais tudo, mais cultura, mais serviço) ou nós vamos continuar comendo na mão de
meia dúzia de grupos que fazem o que querem e querem puxar o país pra cá ou pra
lá. O Brasil é um dos poucos países importantes do mundo que não tem um marco
regulatório de comunicações eletrônicas e precisa ter, porque as comunicações
eletrônicas são uma concessão pública a uma concessão de um espectro
eletromagnético que é público, que do Estado, que é finito, que é repartido, e
que tem que ter regras pra isso. Todos os serviços que são explorados em regime
de concessão pública, todos sem excessão no Brasil, tem marco regulatório, tem
agências que regulam, menos a comunicação. Ônibus urbano, ônibus interestadual,
companhias de aviação, gás, energia elétrica, tudo o que você pensar que é uma
concessão de serviço público tem uma agência reguladora e tem um marco
regulatório. Menos as comunicações, no caso menos a radiodifusão por quê?
Porque ela se recusa discutir e acusa qualquer tentativa séria de fazer um marco regulatório e
estabelecer um marco regulatório para isso de ela acusa isso de um atentado de
liberdade de imprensa, um discurso que
não cola mais. Hoje já tem muito grupo de telecomunicação, quer dizer de
comunicação que há algum tempo atrás mantinha esse discurso, já foi percebendo
o seguinte: "como que eu volto para o jogo, porque as teles estão passando
por cima de mim e os googles da vida vão passar por cima de mim?" Só que
eles fizeram o discurso de que, sabe aquela história do Antônio Magalhães, que
já se foi, mas quando ele era vivo um grande líder do PFL, um líder respeitado
e forte do PFL, ele dizia o seguinte: "reunião e jantar do PFL que eu não
fui não existiu". No fundo a grande mídia quer dizer o seguinte:
"regulação que eu não quiser, se eu não participar e eu não quero participar, não vai
existir". Vai acabar tendo que existir, porque é maior do que ela. As
mudanças são maiores do que ela.
Porque o governo
Dilma não deu continuidade ao projeto de lei de comunicação elaborado no governo Lula?
Olha, ninguém vai arrancar de mim nenhuma palavra contra o
atual governo. Eu digo o seguinte, o governo Lula deu uma contribuição, não tá
o projeto pronto, mas eu diria que 95% das questões equacionadas, evidentemente
que isso é uma contribuição e sempre foi apresentado como uma contribuição para
o futuro governo, podia ser o José Serra que podia pegar e jogar no lixo, podia
ser a Dilma que ganhasse a eleição e podia jogar no lixo, ou seja é uma
contribuição, porque o governo Lula e eu em particular achávamos que fosse um
tema relevantíssimo pra democracia e pra economia brasileira. Nós estamos na
sociedade da informação e do conhecimento, se não tiver regulação nós vamos
ficar patinando. Então isso foi deixado. Agora, evidentemente que é uma
contribuição que poderia ser aceita no todo, aceita em parte, revista, e encaminhada
para a discussão na sociedade e no Congresso Nacional. Eu espero que o governo
vá encaminhar essa questão porque isso precisa da liderança do governo, trata-se
de uma concessão pública, portanto precisa da liderança do governo e eu espero
que em algum momento o governo faça isso e acho que existe também na
sociedade, se o governo demorar muito, existe uma sociedade também que se movimenta e
bota cada vez mais o assunto em pauta. Não é à toa que você me perguntou isso,
é porque a sociedade hoje em dia está discutindo esse assunto. Ou seja,
isso faz parte da agenda do país. É inevitável que se discuta isso. E essa
discussão vai continuar e existe hoje em dia numerosos grupos que pretendem
apresentar um projeto de lei de iniciativa popular ao Congresso para que o
Congresso se debruce sobre o tema, sabendo das resistências que isso enfrentará
no Congresso. Boa parte dos congressistas são donos de rádio e televisão, o
que, no meu ver, no espírito da Constituição é proibido. Evidentemente eles
lutarão para que isso não seja discutido, mas essa discussão é maior do que as
coisas menores e ela acabará prevalecendo e tô seguro: pode haver radicalização
ali, pode haver extremismo ali, mas no final o país discutirá isso de uma
maneira serena, tranquila, aberta e vai progredir com essa discussão.
A CONFECOM convocada pelo governo teve a participação de
importantíssimos setores empresariais. Ela teve a participação de todas as grande
empresas e todo o setor de telecomunicações. E teve a participação de parte da
radiodifusão. Outra parte, a parte mais poderosa, a parte mais forte, ela se retirou
dentro daquele espírito Antonio Carlos Magalhães, "eu vou sair porque se
eu sair não vai ter nada". E se deu mal porque a conferencia se realizou,
eu acho que a conferencia foi um marco, foi extremamente importante, embora
feita de uma forma tumultuada, caótica. Olha o Brasil não discutia de forma
organizada o assunto desde 1962. Os preconceitos, os temores, os resentimentos
eram monumentais. Tinha gente ali que só queria declarar o princípio e sair,
entende? Tinha gente ali que queria pactuar alguma coisa, havia medo de todos
os lados, e o que nós tivemos? Durante dois, três dias se reuniram
representantes dos setores, discutiram e aprovaram cerca de 700 propostas,
muita proposta ali não tem muito sentido, etc, mas muitas propostas
importantíssimas que serviram de base justamente para que o governo depois se
debruçasse sobre o problema e aquilo que dizia respeito ao novo marco
regulatório fossem reunidos num anteprojeto que foi deixado para o atual
governo. Eu acho que a CONFECOM deixou frutos muito importantes mesmo no
projeto e mesmo numa coisa meio intangível mas que eu acho muito importante,
que ela demonstrou para muitos setores da sociedade civil, do governo, dos
empresários de que é possível travar uma discussão séria sobre o assunto e que
discutindo se avança. E outros setores que saíram pensando que iam interditar a
discussão e descobriram que não conseguem interditar a discussão, porque o
assunto entrou na pauta, é inevitável, e não entrou na pauta porque a CONFECOM
fez isso ou fez aquilo ou porque o ministro Franklin Martins na época foi um
gênio, não nada disso. É porque isso é uma imposição da realidade. Nós estamos
assistindo a um processo de convergência das mídias eletrônicas em todo o
mundo. A base tecnológica está mudando. E isso gera problemas novos que não
podem ser resolvidos pelas legislações anteriores. E se não forem objetos de
uma nova pactuação através de um processo de discussão público, aberta e
transparente, quem vai prevalecer é o mercado sozinho, e quando o mercado
prevalece vence o mais forte. Então eu acho que com o tempo muita gente que
discute contra acabará entendo que jogou mal e que tem que voltar pro jogo. Só uma última coisa sobre a CONFECOM: muitos
órgãos de imprensa, numa tentativa de interditar o debate político sobre esse
tema, na sua cobertura muitos órgãos de
imprensa disseram que a CONFECOM aprovou medidas de controle da mídia. Não
aprovou nada disso. Isso é o caso típico de um péssimo jornalismo feito a serviço
de posições pré-concebidas. O sujeito já saiu com a pauta da redação e tinha
que trazer aquilo que o chefe dele queria. A CONFECOM não aprovou uma proposta
que se referisse a controle social da mídia. Aliás, sendo justo, aprovou uma e
dizia o seguinte: "esforços para criação de um código de ética dos
jornalistas que funciona como um controle social da mídia". Isso na verdade
é uma proposta que você pode até dizer que está mal escrita, mas está se
falando de um código de ética que todos os jornalistas deveriam ter, que não
aprovou nada daquilo. Mas leiam os jornais da época. Todos falaram a mesma
coisa, como se tivesse sido aprovado. O grande problema de boa parte de nossa
imprensa é que ela não independente. Esse é o grande problema. Só existe um
tipo de imprensa independente: é aquela que é independente do governo, mas é independente da oposição. É
independente dos movimentos sociais, mas é independente dos empresários. Que é
independente dos grupos econômicos, dos seus acionistas, e quando é que uma
imprensa consegue ser independente de tanta coisa junto? Quando ela é
dependente dos fatos. Eu aprendi isso quando pisei o primeiro pé numa redação.
Jornalista não briga com fato. Jornalista não briga com o que é real, com o que
acontece, com a notícia. Quem briga, vai perder. Então, a verdade é a seguinte:
a nossa imprensa não independente porque coberturas como essa, ela fez uma
cobertura que é absolutamente independente da única coisa que a imprensa não pode
ser independente: é dos fatos. Ela inventou. Inventou por quê? Porque o chefe
queria. Por que o chefe queria? Porque o dono queria. E por que o dono queria? Porque
a coligação queria. Ou seja, não é pra isso que existe imprensa. E olha, eu
sempre digo isso: o leitor, o expectador, o ouvinte, ele pode ser enganado por
algum tempo, mas ele não pode ser enganado o tempo todo. E o leito, o
expectador, o ouvinte que é extremamente generoso com os erros do da imprensa,
e deve ser, sempre que ele percebe que o erro foi cometido no afã de entregar
uma informação pra ele num tempo hábil, ou seja, correndo contra o relógio, o
leitor é muito generoso que o erro foi cometido quando foi fruto das condições
de trabalho e que o objetivo era informá-lo bem. Não foi, mas era informa-lo
bem. Esse mesmo leitor, telespectador ou ouvinte também é severo quando percebe
que houve manipulação. O que acontece? A credibilidade desse órgão de imprensa
é extremamente afetada e não é à toa que nós estamos vivendo uma crise de
credibilidade da imprensa no Brasil hoje em dia monumental. Sabem eles, sabem
vocês, sabemos todos.
O jovem de hoje e o
jovem dos anos 60.
É difícil, eu acho que qualquer comparação é sempre uma
coisa que você está tentando botar alguém no padrão de alguém e não é justo. A
minha geração quando eu era estudante, tudo o que nós fazíamos nos levava a nos
chocar com a Ditadura imediatamente. Você fazia um jornalzinho de escola, era
censurado. Você deixava em branco a coluna, você era suspenso na escola.
Rapidamente as pessoas protestavam contra a suspensão, eu tô falando de coisas
que aconteceram comigo quando era secundarista. Então, acontece o seguinte:
logo, logo você estava percebendo que quer liberdade, não quer viver sob uma
Ditadura. Com muita facilidade, muita rapidez, as questões do cotidiano se
transformavam em questões políticas. Hoje em dia isso é diferente porque felizmente
nós vivemos numa democracia. Às vezes eu vou em escolas onde me dize: "o
bom era o tempo de vocês", não não, bom é o tempo de vocês que vocês tem
liberdade, vocês vão pra internet, quem quer usar saia curta pode usar, quem
quer namorar, pode namorar que não deve satisfação. Naquela época não. Você não
podia ir pra cama com ninguém só depois do casamento, uma mulher divorciada era
vista como uma mulher esquisita entende? E qualquer manifestação sua tinha que
ser aceita pelo poder. E se não fosse aceita você ia sofrer perseguições por
causa disso. Então eu digo o seguinte: vocês tem uma vida muito melhor do que teve a
minha geração, e felizmente, porque eu acho que foi pra isso que a gente lutou,
pra conquistar a liberdade, democracia. Aí você pode dizer o seguinte: "ah
mas tem muita gente que não usa a liberdade do jeito correto". Mas peraí,
qual é o jeito correto de se usar a liberdade mesmo? Não existe um jeito
correto. Cada um usa do seu jeito. E a sociedade acaba encontrando as formas,
os mecanismos de fomar suas maiorias, de formar seus consensos, de produzir os
novos caminhos. Eu acho o seguinte, o Brasil hoje é muito melhor do que era na
minha época do ponto de vista político, porque a gente não vive sob uma
Ditadura. A direita hoje em dia no
Brasil é mais democrática do que era naquela época. A esquerda é mais
democrática do que era também naquela época. Mas não é só no plano político. O
Brasil é um país muito menos injusto do que era naquela época. Não quer dizer
que não é injusto. Ainda é muito injusto, mas é menos do que era naquela época.
Naquela época falar em reforma agrária era sinônimo de comunismo e sinônimo de
que você tinha que ir pra cadeia. Você falar em voto de analfabeto era
bolchevique, tinha que ir pra cadeia. Você via coisas assim, por que deram o
golpe de Estado? Reforma agrária, reforma urbana, reforma educacional,
voto de analfabeto e voto pra sargento.
Po isso eles fizeram um golpe de Estado e jogaram o país numa noite de terror
de 21 anos. Olha, nós estamos hoje muito melhor. Ainda bem que o jovem hoje dia
pode fazer muito mais besteira do que a gente fazia naquela época. Porque
quando a gente fazia besteira naquela época muitas vezes pagava com a vida.
O governo em relação
aos movimentos que pregam a democratização da comunicação e o projeto de lei de
iniciativa de comunicação
Bom, a primeira questão eu não posso responder, quem pode é
o governo Dilma. Eu não tô no governo,
embora apoie o governo, sou amigo da presidente Dilma, eu não consigo é falar
presidenta Dilma, mas sou amigo da presidente Dilma, acho que o governo está
fazendo coisas importantíssimas, teve avanços extraordinários na questão da
economia, na questão da energia, questão
dos juros. Tá aí, nessa questão [da comunicação] tem que ser perguntada, eu
gostaria que tivesse encaminhado, não precisava ser aquele projeto eu acho que
precisa é o governo liderar o debate, mas isso em algum momento ele fará eu não
tenho nenhuma dúvida. Eu acho que de um modo geral, o projeto de inicativa
popular, é evidente ele não é um código geral de telecomunicações como se
propunha a ser o projeto de marco regulatório que foi deixado, ele foca em
algumas questões, e nas questões principais. Eu acho que é um bom projeto, é um
projeto maduro, eu acho um projeto que ele tem como centro, vamos dizer, a regulamentação
do que está na Constituição e isso eu acho muito importante. Então estão
perfeitamente definidos ali a liberdade de imprensa, ta perfeitamente definido o
sigilo de fonte, ta perfeitamente definido a proteção que toda a pessoa tem
direito a sua imagem, está regulamentando ali a questão da produção nacional,
produção local, da produção independente, se manifesta contra a questão da
propriedade cruzada que na verdade se refere a questão da oligopolização que
está na Constituição, se manifesta contra político ter concessão, se manifesta
contra a venda de horários de espectro a terceiros, porque o Estado não deu direito
de fazer subconcessão a ninguém, eu acho que é um projeto maduro. Você até pode
dizer, isso aqui poderia ser melhor, etc, mas eu acho o seguinte, é um projeto
maduro que coloca os temas principais na questão crucial que tem mais a ver com
telecomunicações que é a questão da neutralidade da rede ele também se manifesta,
então é um projeto maduro, é um bom projeto, dá uma ótima base para discussão,
e eu acho que é um projeto maduro no seguinte: ele ta olhando mais pra frente
do que pra trás, isso eu acho um sinal de maturidade, entende? A questão não é
ver como que vai se acertar a conta com um passado que não volta mais, é
basicamente como se aproveita essa nova onda, que é a questão da digitalização,
da internet, da convergência da mídia, pra nós sermos capazes de promover uma
pactuação na sociedade que dê a sociedade mais e não menos. Mais informação,
mais entretenimento, mais educação, mais serviços, mais games, mais tudo,
entende? E que isso seja plural, não seja concentrado na mão de poucas pessoas,
e que dê no fundo a gente volta a questão anterior, aos jovens, ao cara que tá
lá na favela, na escola, o empresário, a todo mundo, ao camponês, ao lavrador, dê
possibilidade a todo mundo, de não só ouvir, mas de falar. A CUT lançou agora
no 1º de maio uma campanha que eu achei extremamente interessante, apoiando
esse novo projeto de lei de iniciativa popular, e qual é o centro? "Eu
também quero falar!" Não é "você não pode falar". Não se trata
disso. "Eu também quero falar!" Por que eu também não posso falar?
Porque só quem tem muito dinheiro pode falar? Por que quem não tem muito
dinheiro não pode falar? Essa é a questão. E eu tô seguro, isso na sociedade
brasileira assim como na francesa, na italiana, na alemã, na argentina, nos
Estados Unidos, em Portugal, isso acabou sendo resolvido. No Brasil, isso não é
jabuticaba, que só existe no Brasil. Eu acho que isso vai se resolver também.
Porque o Brasil está
mais atrasado que Venezuela, Uruguai e outros países da América Latina em
relação ao marco regulatório?
Eu acho que não é à toa que tantos países estão produzindo
legislações a esse respeito. Por que eu dizia, isso é uma necessidade fruto do
momento que nós vivemos, e também fruto de fato de que boa parte da América
Latina o processo de regulação estava muito mais atrasado do que estava na
Europa, nos Estados Unidos, ou seja, os países que tiveram uma experiência
democrática mais longeva, mais permanente, logo chegaram a compreensão de que
era necessário algum tipo de regulação que aumentasse a pluralidade, que não
permitisse a oligopolização. Então eu acho que isso tem uma base histórica e
tem uma base da mudança do patamar tecnológico que exige isso. Então eu acho que
essa é a primeira coisa. Agora, porque que nos outros países está avançando
mais que no Brasil? Eu vou fazer uma digressão um pouco sociológica pra vocês. Eu
pessoalmente, acho que nós temos características especiais no Brasil quando nós
comparamos com outros países da América Latina. Não to dizendo que somos melhores
nem que somos piores. É o nosso jeito. Nós custamos muito a formar maiorias.
Isso valeu sempre na nossa história. Outros países às vezes já fazem uma
revolução e tal e já saem, emburacam para um caminho, às vezes são obrigados a
voltar para trás por que foram tão rápido e não construíram uma maioria que
segurasse aquilo. O Brasil sempre foi meio lento. Eu costumo brincar e dizer
que nós não somos como os argentinos um potro fogoso que galopa pra lá, galopa
pra cá, dá meia volta, relicha, escoiceia, pula, tira as quatro patas do chão,
nós não somos assim. Nós somos um elefante. Nós temos sempre três pés no chão,
tiramos só um pé de cada vez. E os elefantes não andam devagar não, eles andam
rápido, mas eles só tiram um pé do chão. Isso quer dizer o seguinte: eles estão
o tempo todo fazendo um tipo de movimentação que permita eles ter uma base
mínima pra poder não cair no chão. Por que eles são muito pesados. O Brasil é
muito grande, muito diverso, continental, então nós demoramos a formar
maiorias. Tem uma vantagem. Em geral, quando nós formamos maioria, nós não
voltamos atrás com facilidade também, por quê? Por que é muito difícil formar
uma maioria pra voltar atrás também. Então eu acho que é uma característica
nossa. Nós somos mais lentos, nós demoramos um pouco mais, mas de um modo geral
as nossas mudanças são mais consistentes. Não estou dizendo que é melhor, estou
dizendo que é assim. E nessa questão mais uma vez está se reproduzindo o
modelo. Mas eu acho que produziremos com o tempo um pactuação consistente que
produzirá mudanças importantes e que virão pra ficar, não tenho dúvida.
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