terça-feira, 28 de maio de 2013

Franklin Martins quer que o governo lidere o debate de uma nova lei da mídia

Em coletiva neste sábado (25/05), Franklin Martins (na foto com o microfone) defendeu que o centro da proposta de um novo marco regulatório da mídia é garantir que quem não tenha muito dinheiro possa falar, e não restringir a liberdade das grandes empresas midiáticas.


Os desafios da mídia alternativa, do jornalismo independente e da produção livre de informações frente à vigilância e às imposições do poder tradicional foi o tema de um dos mais concorridos e movimentados debate do Conexões Globais, ocorrido em Porto Alegre/RS, no último sábado (25/05/13). Em virtude desse debate, o Blog Barão Gaucho preparou duas grandes entrevistas especiais. A primeira delas já apresentada ontem, com a jornalista da Carta Capital Cynara Menezes. Hoje é a vez de transcrevermos a entrevista coletiva de Franklin Martins concedida aos órgãos de imprensa, incluindo o Barão, antes de participar da mesa. 
Biografia

Franklin Martins tem uma trajetória extensa e importante como jornalista político. Líder estudantil ativo na resistência a ditadura civil-militar que derrubou o governo João Goulart, Martins foi ministro da Comunicação Social do Brasil durante o mandato presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva até dezembro de 2010. No governo, Franklin Martins trabalhou com as relações do governo com a imprensa, com a publicidade oficial, com a construção do projeto de uma rede nacional pública de TV e com o debate sobre a adoção de um novo marco regulatório da mídia no Brasil. Após sair do governo, vem se dedicando a escrever e debater sobre esses temas em todo o país.

Resumo da entrevista

Nesta entrevista de meia hora de duração, falou entusiasticamente da comunicação na era da internet, apresentou argumentos consistentes em favor de um novo marco regulatório da comunicação dizendo esperar que o governo lidere esse debate na sociedade. Elogiou ainda o projeto de lei de iniciativa popular que propõe um novo marco regulatório considerando-o maduro para possibilitar um debate transparente e sereno. Afirmou que a mídia empresarial vive uma crise de credibilidade pois se divorciou da busca pelos fatos, avaliou que o Brasil vive um momento melhor do que o período da Ditadura inclusive em relação a juventude.  Disse que o centro da questão da liberdade da mídia é garantir liberdade de fala a quem não tem muito dinheiro, e não tolher a liberdade dos meios de comunicação empresariais. E finalizou, analisando a nossa lentidão em relação a outros países da América Latina que já estão mais avançados em criar marcos regulatórios da comunicação. Concluiu que temos uma característica histórica de formar lentamente maiorias, mas que nossas transformações costumam ser consistentes. Posicionou-se com esperança em relação a mudanças importantes na área da comunicação. 
O conteúdo da entrevista que repassamos ao leitor é consistente, e fizemos questão de transcrevê-lo na íntegra, a despeito de sua extensão, por julgar uma importante reflexão sobre um tema relevante da agenda nacional. Com a palavra, Franklin Martins.

A comunicação na era da internet
A internet abre a possibilidade de todo mundo falar. Isso não quer dizer que vai falar a coisa certa. Vai falar a coisa certa, vai falar a coisa errada, vai falar coisa séria, vai falar bobagem, vai ter de tudo. Mas é o seguinte: Quem disse que os donos da fala antes só falavam coisas sérias, só falavam coisas importantes e verdades? Eles também mentiam, falavam bobagem, se expressavam mal, difundiam preconceitos, defendiam interesses, então, nesse sentido, a bagunça da internet, blogosfera, tudo isso, é uma bagunça bem-vinda, embora seguramente com o amadurecimento ela vai acabar produzindo coisas vamos dizer assim mais estáveis, mas eu acho que pra juventude, olha é uma coisa extraordinária ela poder falar, chegar longe e não ter que estar pedindo licença a ninguém para entrar na discussão.
 Democracia e comunicação, velhas e novas mídias

Eu acho que nós estamos vivendo um processo de democratização da mídia apesar da mídia. Mesmo com a mídia não querendo, por causa da internet, porque como eu dizia não existe mais um único núcleo ou poucos núcleos produtores de informação, isso começou a ser quebrado, então hoje em dia você tem muito mais gente se expressando. Mas isso acontece na internet, isso acontece nas novas mídias. Nas velhas mídias não acontece, porque algumas das velhas mídias são muito caras, muito custosas, exigem recurso muito grande e por isso mesmo a maioria das pessoas não tem como reunir esses recursos pra isso, mas isso não é um problema para a velha mídia porque ela é muito custosa, exige recursos muito grandes e já não tá dando o grande retorno que dava antes, então tem muitas das velhas mídias dando problemas econômicos muito sérios, é um modelo de negócio que está em crise. Então, nas velhas mídias você tem isso e você tem concentração. Eu acho que é absolutamente indispensável que no caso das comunicações eletrônicas, e eu não estou me referindo a jornal de um modo geral, os jornais e revistas e impressos, a comunicação eletrônica vale dizer telecomunicações e radiodifusão, ou seja, tevê e rádio tem que haver mais pluralidade do que há hoje no Brasil. O Brasil não tem um marco regulatório pra isso, não tem leis, nós vivemos um cipoal de gambiarras, o nosso código geral de telecomunicações tem 51 anos de idade, ele é de uma época onde a televisão era em preto e branco, não existia satélite, não existia rede nacional, não existia videoteipe, não existia digitalização, existia mais televizinho do que televisor no Brasil, eram uns dois milhões de  televisões no Brasil, e nós continuamos com a mesma coisa. Evidente que isso não resolve o problema. E nós vivemos hoje um processo de convergência de mídias que vai diluindo as diferenças entre o que é telecomunicações e o que é radiodifusão. É muito difícil separar o que é um computador e o que é um aparelho de televisão. Cada vez vai ser mais difícil. O que é um celular e o que é uma televisão portátil. Você vai poder assistir televisão numa tevê portátil, num celular, num computador, vai poder não, já se assiste e cada vez vai se acentua. Ou seja, se não tiver regra, se não tiver uma nova pactuação é evidente que quem vai vencer é o mais forte. Se depender do mercado vence o mais forte, e no caso são as telecomunicações e um outro ator que está aparecendo que são os googles da vida que começam a aparecer e começam a se tornar porta da entrada para a internet, é um problema importante a ser discutido. Então, nós temos a possibilidade de fazer uma pactuação hoje  em dia, uma nova pactuação, um debate público, aberto, transparente, onde todo mundo participe, seja ao final decidido no Congresso. Mas tem que ser aberto, público e transparente, não é numa sala fechada com os técnicos do governo decidindo e fazendo lobby. Não, uma discussão aberta na sociedade do que nós queremos. Vamos aproveitar que tem essa passagem do analógico para o digital e uma formidável ferramenta que é a internet para oferecer mais (mais conteúdo, mais informação, mais entretenimento, mais jogo, mais tudo, mais cultura, mais serviço) ou nós vamos continuar comendo na mão de meia dúzia de grupos que fazem o que querem e querem puxar o país pra cá ou pra lá. O Brasil é um dos poucos países importantes do mundo que não tem um marco regulatório de comunicações eletrônicas e precisa ter, porque as comunicações eletrônicas são uma concessão pública a uma concessão de um espectro eletromagnético que é público, que do Estado, que é finito, que é repartido, e que tem que ter regras pra isso. Todos os serviços que são explorados em regime de concessão pública, todos sem excessão no Brasil, tem marco regulatório, tem agências que regulam, menos a comunicação. Ônibus urbano, ônibus interestadual, companhias de aviação, gás, energia elétrica, tudo o que você pensar que é uma concessão de serviço público tem uma agência reguladora e tem um marco regulatório. Menos as comunicações, no caso menos a radiodifusão por quê? Porque ela se recusa discutir e acusa qualquer tentativa séria de fazer um marco regulatório e estabelecer um marco regulatório para isso de ela acusa isso de um atentado de liberdade de imprensa, um  discurso que não cola mais. Hoje já tem muito grupo de telecomunicação, quer dizer de comunicação que há algum tempo atrás mantinha esse discurso, já foi percebendo o seguinte: "como que eu volto para o jogo, porque as teles estão passando por cima de mim e os googles da vida vão passar por cima de mim?" Só que eles fizeram o discurso de que, sabe aquela história do Antônio Magalhães, que já se foi, mas quando ele era vivo um grande líder do PFL, um líder respeitado e forte do PFL, ele dizia o seguinte: "reunião e jantar do PFL que eu não fui não existiu". No fundo a grande mídia quer dizer o seguinte: "regulação que eu não quiser, se eu não  participar e eu não quero participar, não vai existir". Vai acabar tendo que existir, porque é maior do que ela. As mudanças são maiores do que ela. 



Porque o governo Dilma não deu continuidade ao projeto de lei de comunicação elaborado no governo Lula?
Olha, ninguém vai arrancar de mim nenhuma palavra contra o atual governo. Eu digo o seguinte, o governo Lula deu uma contribuição, não tá o projeto pronto, mas eu diria que 95% das questões equacionadas, evidentemente que isso é uma contribuição e sempre foi apresentado como uma contribuição para o futuro governo, podia ser o José Serra que podia pegar e jogar no lixo, podia ser a Dilma que ganhasse a eleição e podia jogar no lixo, ou seja é uma contribuição, porque o governo Lula e eu em particular achávamos que fosse um tema relevantíssimo pra democracia e pra economia brasileira. Nós estamos na sociedade da informação e do conhecimento, se não tiver regulação nós vamos ficar patinando. Então isso foi deixado. Agora, evidentemente que é uma contribuição que poderia ser aceita no todo, aceita em parte, revista, e encaminhada para a discussão na sociedade e no Congresso Nacional. Eu espero que o governo vá encaminhar essa questão porque isso precisa da liderança do governo, trata-se de uma concessão pública, portanto precisa da liderança do governo e eu espero que em algum momento o governo faça isso e acho que existe também na sociedade,  se o governo demorar muito,  existe uma sociedade também que se movimenta e bota cada vez mais o assunto em pauta. Não é à toa que você me perguntou isso, é porque a sociedade hoje em dia está discutindo esse assunto. Ou seja, isso faz parte da agenda do país. É inevitável que se discuta isso. E essa discussão vai continuar e existe hoje em dia numerosos grupos que pretendem apresentar um projeto de lei de iniciativa popular ao Congresso para que o Congresso se debruce sobre o tema, sabendo das resistências que isso enfrentará no Congresso. Boa parte dos congressistas são donos de rádio e televisão, o que, no meu ver, no espírito da Constituição é proibido. Evidentemente eles lutarão para que isso não seja discutido, mas essa discussão é maior do que as coisas menores e ela acabará prevalecendo e tô seguro: pode haver radicalização ali, pode haver extremismo ali, mas no final o país discutirá isso de uma maneira serena, tranquila, aberta e vai progredir com essa discussão.
Avaliação da CONFECOM em 2009
A CONFECOM convocada pelo governo teve a participação de importantíssimos setores empresariais. Ela teve a participação de todas as grande empresas e todo o setor de telecomunicações. E teve a participação de parte da radiodifusão. Outra parte, a parte mais poderosa, a parte mais forte, ela se retirou dentro daquele espírito Antonio Carlos Magalhães, "eu vou sair porque se eu sair não vai ter nada". E se deu mal porque a conferencia se realizou, eu acho que a conferencia foi um marco, foi extremamente importante, embora feita de uma forma tumultuada, caótica. Olha o Brasil não discutia de forma organizada o assunto desde 1962. Os preconceitos, os temores, os resentimentos eram monumentais. Tinha gente ali que só queria declarar o princípio e sair, entende? Tinha gente ali que queria pactuar alguma coisa, havia medo de todos os lados, e o que nós tivemos? Durante dois, três dias se reuniram representantes dos setores, discutiram e aprovaram cerca de 700 propostas, muita proposta ali não tem muito sentido, etc, mas muitas propostas importantíssimas que serviram de base justamente para que o governo depois se debruçasse sobre o problema e aquilo que dizia respeito ao novo marco regulatório fossem reunidos num anteprojeto que foi deixado para o atual governo. Eu acho que a CONFECOM deixou frutos muito importantes mesmo no projeto e mesmo numa coisa meio intangível mas que eu acho muito importante, que ela demonstrou para muitos setores da sociedade civil, do governo, dos empresários de que é possível travar uma discussão séria sobre o assunto e que discutindo se avança. E outros setores que saíram pensando que iam interditar a discussão e descobriram que não conseguem interditar a discussão, porque o assunto entrou na pauta, é inevitável, e não entrou na pauta porque a CONFECOM fez isso ou fez aquilo ou porque o ministro Franklin Martins na época foi um gênio, não nada disso. É porque isso é uma imposição da realidade. Nós estamos assistindo a um processo de convergência das mídias eletrônicas em todo o mundo. A base tecnológica está mudando. E isso gera problemas novos que não podem ser resolvidos pelas legislações anteriores. E se não forem objetos de uma nova pactuação através de um processo de discussão público, aberta e transparente, quem vai prevalecer é o mercado sozinho, e quando o mercado prevalece vence o mais forte. Então eu acho que com o tempo muita gente que discute contra acabará entendo que jogou mal e que tem que voltar pro jogo.  Só uma última coisa sobre a CONFECOM: muitos órgãos de imprensa, numa tentativa de interditar o debate político sobre esse tema, na sua cobertura  muitos órgãos de imprensa disseram que a CONFECOM aprovou medidas de controle da mídia. Não aprovou nada disso. Isso é o caso típico de um péssimo jornalismo feito a serviço de posições pré-concebidas. O sujeito já saiu com a pauta da redação e tinha que trazer aquilo que o chefe dele queria. A CONFECOM não aprovou uma proposta que se referisse a controle social da mídia. Aliás, sendo justo, aprovou uma e dizia o seguinte: "esforços para criação de um código de ética dos jornalistas que funciona como um controle social da mídia". Isso na verdade é uma proposta que você pode até dizer que está mal escrita, mas está se falando de um código de ética que todos os jornalistas deveriam ter, que não aprovou nada daquilo. Mas leiam os jornais da época. Todos falaram a mesma coisa, como se tivesse sido aprovado. O grande problema de boa parte de nossa imprensa é que ela não independente. Esse é o grande problema. Só existe um tipo de imprensa independente: é aquela que é independente do governo,  mas é independente da oposição. É independente dos movimentos sociais, mas é independente dos empresários. Que é independente dos grupos econômicos, dos seus acionistas, e quando é que uma imprensa consegue ser independente de tanta coisa junto? Quando ela é dependente dos fatos. Eu aprendi isso quando pisei o primeiro pé numa redação. Jornalista não briga com fato. Jornalista não briga com o que é real, com o que acontece, com a notícia. Quem briga, vai perder. Então, a verdade é a seguinte: a nossa imprensa não independente porque coberturas como essa, ela fez uma cobertura que é absolutamente independente da única coisa que a imprensa não pode ser independente: é dos fatos. Ela inventou. Inventou por quê? Porque o chefe queria. Por que o chefe queria? Porque o dono queria. E por que o dono queria? Porque a coligação queria. Ou seja, não é pra isso que existe imprensa. E olha, eu sempre digo isso: o leitor, o expectador, o ouvinte, ele pode ser enganado por algum tempo, mas ele não pode ser enganado o tempo todo. E o leito, o expectador, o ouvinte que é extremamente generoso com os erros do da imprensa, e deve ser, sempre que ele percebe que o erro foi cometido no afã de entregar uma informação pra ele num tempo hábil, ou seja, correndo contra o relógio, o leitor é muito generoso que o erro foi cometido quando foi fruto das condições de trabalho e que o objetivo era informá-lo bem. Não foi, mas era informa-lo bem. Esse mesmo leitor, telespectador ou ouvinte também é severo quando percebe que houve manipulação. O que acontece? A credibilidade desse órgão de imprensa é extremamente afetada e não é à toa que nós estamos vivendo uma crise de credibilidade da imprensa no Brasil hoje em dia monumental. Sabem eles, sabem vocês, sabemos todos.
O jovem de hoje e o jovem dos anos 60.
É difícil, eu acho que qualquer comparação é sempre uma coisa que você está tentando botar alguém no padrão de alguém e não é justo. A minha geração quando eu era estudante, tudo o que nós fazíamos nos levava a nos chocar com a Ditadura imediatamente. Você fazia um jornalzinho de escola, era censurado. Você deixava em branco a coluna, você era suspenso na escola. Rapidamente as pessoas protestavam contra a suspensão, eu tô falando de coisas que aconteceram comigo quando era secundarista. Então, acontece o seguinte: logo, logo você estava percebendo que quer liberdade, não quer viver sob uma Ditadura. Com muita facilidade, muita rapidez, as questões do cotidiano se transformavam em questões políticas. Hoje em dia isso é diferente porque felizmente nós vivemos numa democracia. Às vezes eu vou em escolas onde me dize: "o bom era o tempo de vocês", não não, bom é o tempo de vocês que vocês tem liberdade, vocês vão pra internet, quem quer usar saia curta pode usar, quem quer namorar, pode namorar que não deve satisfação. Naquela época não. Você não podia ir pra cama com ninguém só depois do casamento, uma mulher divorciada era vista como uma mulher esquisita entende? E qualquer manifestação sua tinha que ser aceita pelo poder. E se não fosse aceita você ia sofrer perseguições por causa disso. Então eu digo o seguinte: vocês tem uma vida muito melhor do que teve a minha geração, e felizmente, porque eu acho que foi pra isso que a gente lutou, pra conquistar a liberdade, democracia. Aí você pode dizer o seguinte: "ah mas tem muita gente que não usa a liberdade do jeito correto". Mas peraí, qual é o jeito correto de se usar a liberdade mesmo? Não existe um jeito correto. Cada um usa do seu jeito. E a sociedade acaba encontrando as formas, os mecanismos de fomar suas maiorias, de formar seus consensos, de produzir os novos caminhos. Eu acho o seguinte, o Brasil hoje é muito melhor do que era na minha época do ponto de vista político, porque a gente não vive sob uma Ditadura.  A direita hoje em dia no Brasil é mais democrática do que era naquela época. A esquerda é mais democrática do que era também naquela época. Mas não é só no plano político. O Brasil é um país muito menos injusto do que era naquela época. Não quer dizer que não é injusto. Ainda é muito injusto, mas é menos do que era naquela época. Naquela época falar em reforma agrária era sinônimo de comunismo e sinônimo de que você tinha que ir pra cadeia. Você falar em voto de analfabeto era bolchevique, tinha que ir pra cadeia. Você via coisas assim, por que deram o golpe de Estado? Reforma agrária, reforma urbana, reforma educacional, voto  de analfabeto e voto pra sargento. Po isso eles fizeram um golpe de Estado e jogaram o país numa noite de terror de 21 anos. Olha, nós estamos hoje muito melhor. Ainda bem que o jovem hoje dia pode fazer muito mais besteira do que a gente fazia naquela época. Porque quando a gente fazia besteira naquela época muitas vezes pagava com a vida. 
O governo em relação aos movimentos que pregam a democratização da comunicação e o projeto de lei de iniciativa de comunicação
Bom, a primeira questão eu não posso responder, quem pode é o governo Dilma.  Eu não tô no governo, embora apoie o governo, sou amigo da presidente Dilma, eu não consigo é falar presidenta Dilma, mas sou amigo da presidente Dilma, acho que o governo está fazendo coisas importantíssimas, teve avanços extraordinários na questão da economia, na questão  da energia, questão dos juros. Tá aí, nessa questão [da comunicação] tem que ser perguntada, eu gostaria que tivesse encaminhado, não precisava ser aquele projeto eu acho que precisa é o governo liderar o debate, mas isso em algum momento ele fará eu não tenho nenhuma dúvida. Eu acho que de um modo geral, o projeto de inicativa popular, é evidente ele não é um código geral de telecomunicações como se propunha a ser o projeto de marco regulatório que foi deixado, ele foca em algumas questões, e nas questões principais. Eu acho que é um bom projeto, é um projeto maduro, eu acho um projeto que ele tem como centro, vamos dizer, a regulamentação do que está na Constituição e isso eu acho muito importante. Então estão perfeitamente definidos ali a liberdade de imprensa, ta perfeitamente definido o sigilo de fonte, ta perfeitamente definido a proteção que toda a pessoa tem direito a sua imagem, está regulamentando ali a questão da produção nacional, produção local, da produção independente, se manifesta contra a questão da propriedade cruzada que na verdade se refere a questão da oligopolização que está na Constituição, se manifesta contra político ter concessão, se manifesta contra a venda de horários de espectro a terceiros, porque o Estado não deu direito de fazer subconcessão a ninguém, eu acho que é um projeto maduro. Você até pode dizer, isso aqui poderia ser melhor, etc, mas eu acho o seguinte, é um projeto maduro que coloca os temas principais na questão crucial que tem mais a ver com telecomunicações que é a questão da neutralidade da rede ele também se manifesta, então é um projeto maduro, é um bom projeto, dá uma ótima base para discussão, e eu acho que é um projeto maduro no seguinte: ele ta olhando mais pra frente do que pra trás, isso eu acho um sinal de maturidade, entende? A questão não é ver como que vai se acertar a conta com um passado que não volta mais, é basicamente como se aproveita essa nova onda, que é a questão da digitalização, da internet, da convergência da mídia, pra nós sermos capazes de promover uma pactuação na sociedade que dê a sociedade mais e não menos. Mais informação, mais entretenimento, mais educação, mais serviços, mais games, mais tudo, entende? E que isso seja plural, não seja concentrado na mão de poucas pessoas, e que dê no fundo a gente volta a questão anterior, aos jovens, ao cara que tá lá na favela, na escola, o empresário, a todo mundo, ao camponês, ao lavrador, dê possibilidade a todo mundo, de não só ouvir, mas de falar. A CUT lançou agora no 1º de maio uma campanha que eu achei extremamente interessante, apoiando esse novo projeto de lei de iniciativa popular, e qual é o centro? "Eu também quero falar!" Não é "você não pode falar". Não se trata disso. "Eu também quero falar!" Por que eu também não posso falar? Porque só quem tem muito dinheiro pode falar? Por que quem não tem muito dinheiro não pode falar? Essa é a questão. E eu tô seguro, isso na sociedade brasileira assim como na francesa, na italiana, na alemã, na argentina, nos Estados Unidos, em Portugal, isso acabou sendo resolvido. No Brasil, isso não é jabuticaba, que só existe no Brasil. Eu acho que isso vai se resolver também. 
Porque o Brasil está mais atrasado que Venezuela, Uruguai e outros países da América Latina em relação ao marco regulatório?
Eu acho que não é à toa que tantos países estão produzindo legislações a esse respeito. Por que eu dizia, isso é uma necessidade fruto do momento que nós vivemos, e também fruto de fato de que boa parte da América Latina o processo de regulação estava muito mais atrasado do que estava na Europa, nos Estados Unidos, ou seja, os países que tiveram uma experiência democrática mais longeva, mais permanente, logo chegaram a compreensão de que era necessário algum tipo de regulação que aumentasse a pluralidade, que não permitisse a oligopolização. Então eu acho que isso tem uma base histórica e tem uma base da mudança do patamar tecnológico que exige isso. Então eu acho que essa é a primeira coisa. Agora, porque que nos outros países está avançando mais que no Brasil? Eu vou fazer uma digressão um pouco sociológica pra vocês. Eu pessoalmente, acho que nós temos características especiais no Brasil quando nós comparamos com outros países da América Latina. Não to dizendo que somos melhores nem que somos piores. É o nosso jeito. Nós custamos muito a formar maiorias. Isso valeu sempre na nossa história. Outros países às vezes já fazem uma revolução e tal e já saem, emburacam para um caminho, às vezes são obrigados a voltar para trás por que foram tão rápido e não construíram uma maioria que segurasse aquilo. O Brasil sempre foi meio lento. Eu costumo brincar e dizer que nós não somos como os argentinos um potro fogoso que galopa pra lá, galopa pra cá, dá meia volta, relicha, escoiceia, pula, tira as quatro patas do chão, nós não somos assim. Nós somos um elefante. Nós temos sempre três pés no chão, tiramos só um pé de cada vez. E os elefantes não andam devagar não, eles andam rápido, mas eles só tiram um pé do chão. Isso quer dizer o seguinte: eles estão o tempo todo fazendo um tipo de movimentação que permita eles ter uma base mínima pra poder não cair no chão. Por que eles são muito pesados. O Brasil é muito grande, muito diverso, continental, então nós demoramos a formar maiorias. Tem uma vantagem. Em geral, quando nós formamos maioria, nós não voltamos atrás com facilidade também, por quê? Por que é muito difícil formar uma maioria pra voltar atrás também. Então eu acho que é uma característica nossa. Nós somos mais lentos, nós demoramos um pouco mais, mas de um modo geral as nossas mudanças são mais consistentes. Não estou dizendo que é melhor, estou dizendo que é assim. E nessa questão mais uma vez está se reproduzindo o modelo. Mas eu acho que produziremos com o tempo um pactuação consistente que produzirá mudanças importantes e que virão pra ficar, não tenho dúvida.   
 
 


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